Crônica
"Saudade o meu remédio é cantar".
Em meados dos anos 80, recém
chegado em Fortaleza, fui apresentado a Christiano Câmara (foto) pelo saudoso Luciano
Miranda. Desde então, o visitei sistematicamente, ora para realizar pesquisas,
conhecer um pouco mais do seu acervo, ora para me deliciar com suas histórias
sobre uma Fortaleza que não existe mais. Em meio a livros, discos, revistas e
fotos, o que mais me encantava era o seu jeito simples e, principalmente, a sua
empolgação com que ele derramava em palavras suas lembranças e vivenciais sobre
os personagens da música, da poesia e da cultura cearense. Em um das
entrevistas que fiz com o memorialista, ele me contou sobre um suposto romance entre
a Ema do Parque e o Bode Oiô. Segundo Câmara, existia uma ema no Parque
das Crianças. “O bode Oiô estava muito interessado nela”, relevou-me em meio a risos.
Essa Informações depois me foi confirmada pelo também saudoso, Audifax Rios. À época pensei em fazer um curta metragem
sobre essa história, mais acabei engavetando o projeto.
Quem passava naquela Travessa, tranquila, do Centro da Cidade, ao lado do Passo Municipal, conhecida como Rua da
Escadinha e depois entrasse na casa, cujo os fundos era banhado pelo Riacho Pajeú, de corredor cumprido, ladeado por fotos nas
paredes, parecia entrar numa espécie de túnel do tempo, rememorando um passado
ainda vivo sobre a Fortaleza dos tempos idos que não volta mais.
O café da dona Douvina (foto), com que
foi casado por 59 anos, não podia faltar para quem quer que lá chegasse. A
companheira era quem cuidava do acervo particular do casal. Receptivo, o
pesquisador servia de fonte para universitários, jornalistas, publicitários, roteiristas
e cineastas, fotógrafos ou simplesmente curiosos à cata de particularidades
sobre Fortaleza que só ele sabia. Sabia porque viveu. Sabia porque colecionava.
Sabia porque amava o que fazia.
O rádio e os gramofones
Uma das paixões de Christiano era
o Rádio. Às tardes, em dos seus
gramofones de época, não faltavam músicas dos “bolachões” de Ataúlfo Alves e
Dalva de Oliveira e, principalmente de Marlene, considerada a estrela de Ouro
do Rádio brasileiro, segundo Cristiano,
ela recebeu esse título no programa “César de Alencar” entre 1949 e
1951. “Foi lá, na Rádio Nacional, que Marlene ganhou o título de Rainha do
Rádio, em uma acirrada disputa com Emilinha Borba, cantora de maior sucesso
à época, relata o pesquisador.
A voz de Marlene imortalizou marchinhas
e letras famosas. Do autor cearense, Humberto Teixeira, cantou “Qui nem Jiló”,
escrita em parceria com Luís Gonzaga. Um trecho dessa música é uma boa forma de
homenagear Christiano Câmara, um pedaço da história de Fortaleza que se vai: “Saudade,
o meu remédio é cantar”.
No link abaixo letra "Qui nem jiló" na íntegra na voz de Marlene.
Uerbet Santos
Fotos: Blog do Eliomar e Divulgação G1