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“O Ramo da prestação de serviço é um muito perigoso
para quem não tem honestidade nem ética”. Patrício Almeida |
A Ordem dos Advogados do Brasil, secção Ceará, por deliberação do Conselho Pleno, outorgou a medalha de Advogado Padrão à Patrício Almeida por dignificar a profissão com honradez e ética, há mais de 30 anos. Segundo Patrício (que preside a Comissão de Credores e Precatórios e é vice da Comissão do Idoso), o seu reconhecimento é fruto de sua trajetória profissional correta, sem nódoa no currículo e nem um processo disciplinar. Ele me recebeu em seu escritório para uma entrevista exclusiva. O Advogado, entre outros assuntos, falou sobre sua difícil trajetória de vida, principalmente quando morava na fazenda Boi Pintado no distrito de São José da Macaóca em Quixeramobim - CE, hoje Madalena. Agradeceu às lições de vida que aprendeu com os pais, José Patrício de Almeida e Maria Alice Sousa Almeida. Detalhou as diversas profissões que abraçou para custear os estudos e sustentar os irmãos, a mulher e filhos (Patrícia Regina, Paulo Robson, Plínio Regis). Descreveu o papel da OAB em prol dos advogados e do cidadão além de dar dicas para os futuros advogados sobre como passar no exame de Ordem e vencer na profissão. Leia a entrevista na íntegra.
Uerbet Santos - Dr. Patrício, hoje do alto dos seus 61 anos, bem casado e pai de três filhos, olhando para trais, foi difícil sua trajetória até aqui?
Patrício Almeida - Como diria Carlos Drummond de Andrade, ‘No meio do caminho tinha uma pedra... ...Tinha uma pedra no meio do caminho’. Toda profissão no começo é espinhosa. É por isso que a perseverança do cidadão é que faz o profissional de sucesso.
Uerbet Santos - O que ou quem serviu de espelho para o seu sucesso profissional?
Patrício Almeida - Foi a perseverança do meu pai (José Patrício de Almeida), um cidadão que saiu lá no sertão “brabo” do Quixeramobim, vendeu a fazenda e o sitio que tinha e veio pra capital (Fortaleza). Ele, ao invés do peixe, deu uma vara e um anzol para os filhos pescarem. Pescou quem quis.
Uerbet Santos - Fale um pouco desse difícil começo lá no interior?
Patrício Almeida - Pra você ter uma ideia da dificuldade que passávamos a minha mãe (Maria Alice Sousa Almeida) pariu 17 filhos, criou 13 deles e só o meu irmão caçula nasceu na maternidade, os outros nasceram de “cachimbeira” (parteira). Eu sou o 2º dessa prole. Mamãe é uma heroína. (emocionado)
Uerbet Santos - Quando as coisas começaram a mudar para melhor?
Patrício Almeida - Meu pai resolveu alugar uma casa em Canindé, pois o distrito de São José da Macaóca, onde nós morávamos, ficava a 54 km de Canindé. Ele mandou minha mãe pra lá com toda a prole. Todo fim de semana meu pai ia para o Canindé com os queijos que fazia durante a semana, vendia na Feira e cobria os gastos da família.
Uerbet Santos – Sobre sua vinda à Fortaleza para estudar, também foi um momento muito difícil?
Patrício Almeida - Meu irmão mais velho terminou o ginásio em 1966 e veio para Fortaleza. Ficou na casa de um parente. Um ano depois eu também terminei o 1º grau e na época com 18 anos, arrimo de família, vim encarar os desafios da cidade grande pra estudar e trabalhar. Meu pai comprou um terreno de 12 de frente por 40 de fundos no Jardim América, fez uma casinha nos fundos do terreno de três cômodos e botou minha mãe e nós todos (13 filhos) lá. De 15 em 15 dias ele vinha, e quando não dava pra viajar, mandava os queijos para nós vendermos na Feira da Gentilândia. Mas, depois de três meses eu não precisava mais ir pra Feira, pois já tinha a freguesia própria.
Uerbet Santos – O Senhor aprendeu desde cedo a trabalhar, a ter responsabilidade, que outras atividades informais exerceu nessa época de vacas magras pra ajudar na conclusão do seu 2º grau?
Patrício Almeida - Além de ajudar meus irmãos a venderem queijo, fui servente de pedreiro, pintor de parede, lavei e encerei casa para ganhar “o do cigarro”, vendedor de livro e de uniformes profissionais e distribui lista telefônica nas casas de Fortaleza. Depois, graças a um curso de datilografia lá no Canindé, passei a ser datilografo na Clinica Radiológica Prof. Manuel de Abreu onde comecei lavando banheiro e fazia o financeiro da Clinica e quando saia de lá, ia para o Farias Brito onde eu fiz o 3º ano científico (era bolsista). Antes, estudei no Colégio Paulo VI onde eu fiz o 1º e o 2º ano.
Uerbet Santos – Depois que o Senhor passou no Vestibular para direito deu para conciliar trabalho e estudo.
Patrício Almeida - Passei em 15º lugar na Universidade Federal do Ceará para Humanidades. Naquela época era vestibular para Ciências (1.250 vagas) e Humanidade (850 vagas). Escolhi Direito. Com a faculdade, não pude mais trabalhar os dois expedientes. Sai da Clinica, mas continuei fazendo as contas médicas do faturamento para os órgãos que eram conveniados na Clínica, isso nos fins de semana, percebendo 1% (um por cento) do faturamento, ganhando mais do que quando trabalhava fixo. Mesmo assim, a grana era curta. No meio do curso resolvi casar escondido, somente o civil, passava na casa da “noiva” e deixava a grana para pagar o enxoval. Passei a ser conhecido por meus irmãos (que sempre me pediam uma “ajudazinha”), de “cara dos cinco cruzeiros”, porque só tinha o do ônibus (risos)”. E ainda pagava a conta da “bodega” para os meus irmãos que não trabalhavam.
Uerbet Santos – De universitário a advogado, como foi esse período da sua vida?
Patrício Almeida - Casei escondido no Civil, como já disse no meio do curso de Direito, só depois no Religioso. Tive que trancar minha faculdade durante um ano, pois minha esposa (grávida) teve que fazer a faculdade dela em Mossoró-RN. Já como advogado meu último emprego foi como chefe de auditoria do Grupo Ultralimpo. Depois, fui ser gerente financeiro e advogado da Anfisauto Veículos do Grupo Ângelo Figueiredo. Advoguei para Gaudêncio Gonçalves de Lucena e Elias Hissa Filho que estavam começando suas vidas como empresários. Mas, sempre tive vinculo com alguém. Só a partir de 19/06/1987 deixei de ser empregado e comecei a minha carreira solo.
Uerbet Santos N – O Senhor preside a Comissão de Credores e Precatórios da OAB-CE, como funciona essa comissão?
Patrício Almeida - Os precatórios são créditos que o cidadão ou a empresa tem contra o órgão público que não podem ser executados. São protegidos por lei. O Brasil acumula uma dívida de 100 bilhões de Reais, desse montante, o Estado de São Paulo é o maior devedor com 30 Bilhões em papeis precatórios. Eles inventaram o precatório pra dar o calote. Criaram a PEC 62, que chamamos de a PEC do calote oficial para arrolar a dívidas e ficarem até 15 anos sem pagá-las.
Uerbet Santos – O Senhor concorda que o são dois pesos e duas medidas, que há uma inversão de valores?
Patrício Almeida - É, no mínimo, um contrassenso do governo. Se você tem dívida com o Estado, Município ou a União, ou deve o IPTU da sua casa, eles são capazes de te executar, tomar até seu imóvel e você ir morar debaixo da ponte, mas quando os papeis se invertem, ou seja, quando o governo é quem deve, isso não acontece.
Uerbet Santos – O Senhor também é vice-presidente da Comissão do Idoso, qual a contribuição da OAB-CE para a 3ª idade?
Patrício Almeida - Segundo Arnaldo Jabor: ‘ Ser hetero hoje é ser discriminado’. Com o idoso não é diferente, são desrespeitados com frequência. Eu mesmo já presenciei em uma Casa Lotérica o descumprimento do Estatuto do Idoso que é regido pela Lei Federal nº 10.741 de 1º de outubro de 2003 que garante os direitos fundamentais do idoso, em condições de igualdade, liberdade e dignidade como garante o Art. 4º (nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligencia, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação o ou missão, será punido na forma da Lei) no seu §1º (É dever de todos prevenir a ameaça ou violação aos direitos do idoso). Eu, inclusive, se tiver respondendo pela Presidência da Comissão, pois, eu e o Presidente sempre fazemos um revezamento, temos poder de prisão. Outro exemplo da nossa representatividade é que temos cadeira cativa ao lado da Presidente do Conselho Estadual do Idoso.
Uerbet Santos – Qual a principal atribuição da OAB - CE?
Patrício Almeida - É administrar a profissão do (a) advogado (a), fazer o exame de ordem, tirar sua carteira e fiscaliza-lo. Caso o (a) Advogado (a) saia dos trilhos ou tenha alguma representação contra ele, a OAB gera um processo disciplinar contra o mesmo. Eu sirvo de exemplo. Se nesses 30 anos eu tivesse um processo se quer, não receberia essa medalha, pois seria antiético. Eu nunca advoguei contra um ex-cliente. Pois eu conheço os segredos dos mesmos. Isso é ser ético.
Uerbet Santos – A Ordem dos Advogados também exerce a função de defensora do cidadão?
Patrício Almeida - Tudo que se passa com o cidadão a OAB tem por obrigação Institucional estar vigilante. Ex: Se você detecta uma cobrança abusiva ou má qualidade nos serviços privados de energia, podemos entrar com uma ação civil pública com ou sem o Ministério Público. As 45 comissões da OAB-CE existem exatamente para garantir o direito do cidadão, como a Comissão de Direitos Humanos, por exemplo.
Uerbet Santos – Tem ganhado destaque na mídia notícias sobre o alto grau dificuldade das provas da OAB para o exame de Ordem. Qual seu posicionamento sobre o assunto?
Patrício Almeida - Eu tenho uma posição muito particular sobre o exame de Ordem. Em 06/05/1980 eu fiz o meu. Foram dados dez temas para ser escolhido um, tirei nota oito na prova oral. Na Prova escrita foi sorteada uma medida cautelar inominada, eu estava com toda ela na cabeça, tirei nota dez. Passei com média nove. Sei de vários bacharéis que também passaram inclusive duas sobrinhas uma delas passou em 1º lugar e meu filho caçula Plínio Regis, que passou antes mesmo de terminar o curso de direito, protegido por uma liminar no último semestre, e hoje, é Procurador do Estado do Amapá. De onde eu concluo que quem estuda tem êxito. Aqueles que vão pra Faculdade só pra dizer que tem o Curso de Direito não vão passar nunca. Por que não têm o hábito de ler, não sabem fazer uma redação...
Uerbet Santos – Hoje ainda tem espaço no mercado de trabalho para os advogados ou esse segmento está saturado?
Patrício Almeida - A OAB tem 70 anos, meu nº de ordem foi o 3.380, hoje já tem 26 mil inscritos. A realidade é que hoje, a maioria dos estudantes que procuram fazer Direito, é só para fazer concurso público. Não querem ralar o cinto no Balcão. Espaço há, mais tem que ter perseverança para atuar na prestação de serviço de Advocacia.
Uerbet Santos - Qual a palavra de ordem para quem quer crescer nessa profissão?
Patrício Almeida - Para quem está começando, o caminho certo é usar a ética e ter bons princípios. E isso meu pai me ensinou muito bem. Eu tinha quatro anos lá em São José da Macaóca, na fazenda Boi Pintado, e estava brincando no alpendre com um carrinho de boi feito à mão. Meu pai perguntou onde eu tinha achado o carrinho? ‘Lá na cacimba do gado’, respondi. Ele ordenou pra eu ir deixar lá na mesma hora. Fui e voltei numa carreira só, isso já era 17h45min, escurecendo. Ou seja, aquelas coisas que acontecem com a gente, principalmente os bons ensinamentos dos pais é que tomamos como exemplo.