12/15/14

CATADORES DA ESPERANÇA


                                                                      
Carolina é uma menina como tantas outras da sua idade. Com apenas cinco anos, já demonstra senso de responsabilidade. Acorda cedo para ir à escola sem que sua mãe precise chamá-la. Faz seus trabalhos escolares e seu dever de casa todas as tardes sentada na varanda da sua casa com a ajuda da tia.  Adora cantar. Querida por todos.  O xodó das amiguinhas do colégio, da vizinhança, dos professores e familiares. Seus olhos parecem o céu de tão azuis, irradiando o brilho da felicidade. Seu sorriso, cativante. Seus pais a tem como uma pérola, uma benção de Deus, já que é filha única. Seus cachinhos loiros chamam a atenção. Elogios não faltavam àquela doce criança, dona de uma beleza inocente de menina dando sinais de que no futuro será uma linda mulher.
Seus pais, João e Berenice, católicos e devotos de São Judas Tadeu, o Santo das causas perdidas, vão à missa todos os sábados para pagar uma promessa prometida em função de uma enfermidade da filha.  Aos dois anos, Carolina foi diagnosticada com um tipo maligno de câncer: leucemia linfocítica aguda. Os médicos não alimentaram esperanças de cura para o caso de Carolina. Mas, contrariando a tudo e a todos, com o tratamento feito e a  fé em Deus dos  seus pais, ela ficou curada.
Para agradecer a graça alcançada, o pai e a mãe de  Caroline, iam  todos os sábados à tarde à igreja de São Judas Tadeu rezar. Caroline também os acompanhava, mas,  enquanto seus pais oravam, Carol e as demais crianças ficavam no pátio externo da Igreja brincando.
Foi numa dessas idas à Igreja, ao final da missa, que os pais de Carol sentiram a falta da filha. Num primeiro momento pensaram que ela tinha ido sozinha pra casa. Mesmo assim, acharam estranha sua atitude, pois ela, apesar de conhecer o trajeto,  nunca tinha voltado da Igreja sem os pais. Preocupados, perguntam aos seus coleguinhas  se a viram.
Clara amiga de Carol responde:
- Ela  tava conversando com o homem lá no portão!
Clara se referia ao portão lateral do pátio da Igreja que assim como o portão principal também dá acesso à rua.
O pai de Carol questiona Clara:
- Que homem era esse?
Clara pensa um pouco e fala:
- Parecia um mendigo, mas era um desses homens que catam latinhas no lixo!
Outro amiguinho que brincava com Clara e Carol  também fala sobre o que viu:
- Ele chamou a Carol e mostrou  uma boneca pra ela.
Clara completa:
- Enquanto eles conversavam a gente continuou brincando, depois disso ela não voltou mais.
Os pais de Carolina se desesperam. A mãe fica aos prantos. E grita sem parar:
- Oh meu Deus! Eu quero minha filha! Eu quero minha filha!.
Seu João mobiliza a comunidade na saída da igreja e fazem uma busca rápida nas redondezas. Vários recicladores são abordados mais nem um deles estava com Carol. A missão fica  cada vez  mais difícil, pois os recicladores são em grande número. Eles povoam as ruas da cidade, muitos deles vivendo dignamente da profissão, outros se fazendo  de  catador para melhor passar e realizar pequenos furtos, roubos e raptar crianças indefesas. A polícia é acionada. A notícia do desaparecimento da menina Carol ganha às páginas policiais.Um retrato falado do suspeito é feito pela polícia. Uma campanha para ajudar a encontrá-la é postada nas redes sociais. Semanas, meses, cinco anos se passam e nem uma noticia sequer sobre o paradeiro de Carolina.
Hoje, 13 anos depois do seu desaparecimento,  Carol completa 18 anos. Não tem bolo nem festa, mas a vela para São Judas Tadeu continua acessa. Seus pais se transformaram em catadores da esperança e como dois maltrapilhos, todos os dias, saem a perambular pelas ruas da cidade a cata do que restou da doce e inocente Carol.
                                                                                                                 
 Por Uerbet Santos
Nota¹ : Texto ilustrado por foto de catadores de lixo reciclável de minha autoria

Nota²: Conto baseado em um caso real acontecido em Fortaleza em 10 de outubro de  2012.  O desaparecimento da menina Alanis, cinco anos,  raptada de uma Igreja no Conjunto Ceará , estripada e encontrada morta em um Matagal no Bairro Antônio Bezerra. O estripador está preso, mas a dor da família é eterna.

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