Mestre Patinho. As múltiplas faces de um artista popular.

6/16/17

Mestre Patinho. As múltiplas faces de um artista popular.

O poeta que escrevia com o corpo

O amigo e Mestre Patinho faleceu neste domingo (11) aos 66 anos. Consultando notícias veiculadas na mídia sobre o ocorrido, obtive a informação de que estava internado devido a sérios problemas na coluna Cervical. Saber seu nome completo: Antônio José da Conceição Ramos, também foi fruto de pesquisa. Agora, para eu dizer que Patinho era mestre na Capoeira de Angola, e tinha múltiplas facetas artísticas, recorri aos arquivos da minha memória, porque, meninos, eu vi.

Patinho nasceu, um dia depois de mim (14 de setembro). Morava da Rua São Pantaleão, em um sobrado no mesmo lado da Igreja do mesmo nome. O conheci, ainda criança, no Colégio Dom Bosco do Maranhão. Eu estudante, ele coordenador de esportes. Há época, todos os alunos tinham nele, um exemplo a ser seguido. O homem que desafiava o ar com seus saltos de capoeira, impunha respeito na molecada.

Múltiplo

Patinho era muitos atletas em um só. Na sua lista de esportes figuravam o judô, Karatê, Ginastica Olímpica e aquele que viria a ser sua grande paixão: a capoeira. Parecia estar em vários lugares da cultura popular ao mesmo tempo. Ora no Tambor de crioula, ora pesquisando e lançando CDs de cânticos de capoeira ou se aprimorando nos ritmos percussivos ou ainda estudando diferentes vertentes da dança, do primitivo ao contemporâneo. Em dado momento, lá estava Patinho exercitando sua leveza no Balé clássico ou envolto com a dança folclórica.

Laborate

Nossos caminhos se cruzaram, depois de algum tempo, no Laboratório de Arte e Dança do Maranhão (Laborarte), onde eu gostava de apreciar as rodas de capoeira e lugar no qual Patinho criou a primeira Escola de Capoeira de Angola do Maranhão. O Mestre, era mais que capoeirista, era um autêntico representante e multiplicador da arte e da cultura popular maranhense.

Essa valorização da arte, da dança, dos ritmos afro indígenas se moldaram nas apresentações que o Mestre fazia naquela sala de capoeira, no primeiro andar daquele sobrado das artes. Lá, Patinho exercitava a sua arte, ao teatralizar suas performances no ritmo da capoeira de angola.

A atmosfera da capoeira

A capoeira é um jogo envolvente, traduzidos nos movimentos do Mestre Patinho, em um harmonia sonora, sensitiva e corporal, onde o som dos pandeiros, agogôs, atabaques, reco-reco, as batidas de palma, a cantoria e os acordes ritmados extraídos de ‘uma cabaça, um arame e um pedaço de pau’: berimbau, ecoavam e contagiava à todos os presentes nas rodas do Laborarte.

Estilos de Capoeira

Enquanto a capoeira regional se volta para a luta em si, com pitadas de artes marciais. A Capoeira de Angola, onde Patinho era Mestre, se molda como um ritual, uma dança, um vai e vem ritmado de corpos que parecem bailar ao invés de lutar.

Estrategista

Patinho era um estrategista, que usava as ‘jogadas’ da capoeira (meia lua, chapéu de couro, chapa, meia lua de compasso, aú, benção e rabo de arraia), como lances, de um xadrez humano. Certa vez, ele me disse: “China [Uerbet], Angola se joga baixo, rasteiro, quase que em câmara lenta, para depois vir a surpresa. A proximidade com o adversário faz da angola, um rito, um espetáculo”.

Artista de alma leve

Esse dialogo corporal, olho no olho, era o que Patinho sabia fazer de melhor. Sua ginga, seu respeito ao oponente e, principalmente, seu amor aos ritmos maranhenses, fizerem dele, não apenas uma referência na capoeira Timbira, mais que isso, o tornaram um artista de rua, um poeta que expressava através do corpo, sua alma leve, que levava, com alegria e gaiatice, a sua arte, seu saber, sua maestria, aonde o povo estava.

Vai Patinho, vai encontrar com seu Mestre, Sapo. Vai dar uma rasteira no tempo, uma meia lua de compasso e iluminar a noite da Ilha. Vai abrilhantar, com o brilho da sua estrela, a roda de capoeira lá no céu. Pois sua guarda, agora está mais alta que nunca. E quando um rabo de arria se soltar lá de cima, quem sabe não é Patinho dando um jeito de dar um pulinho cá em baixo. Por aqui, só nos restar tirar o chapéu de couro pra você. Mestre e amigo Patinho você é uma benção pra nós.